O Globo
01/12/2012 19h07
Governo estuda ações para evitar concentração no setor aéreo
Com o fim da Webjet e fusão de Azul e Trip, limite a empresas estrangeiras pode ser revisto

BRASÍLIA — Com o fim da Webjet e a fusão entre Azul e Trip, a concentração da aviação civil nas mãos de poucas empresas acendeu a luz amarela no governo. Além de mudar as regras de distribuição de slots (autorizações para pouso e decolagens) em aeroportos lotados, como Congonhas e Guarulhos, os técnicos do setor defendem a retirada dos principais entraves à entrada de novas empresas no mercado, como o limite de 20% ao capital estrangeiro, e maior rapidez no processo de concessão, para enfrentar o problema da infraestrutura aeroportuária.

Já há um consenso entre os técnicos de que o teto de participação estrangeira pode subir para 49% ou até acima deste percentual, quando houver concordância entre os países. Mas há resistência por parte da Casa Civil, que teme afetar a soberania do país e defende a necessidade de proteção das empresas nacionais.

— Capital não tem nacionalidade — defendeu um técnico, alegando que a exigência de nacionalidade brasileira para donos de empresa afasta investidores.

Slots seriam redistribuídos em caso de venda

Segundo interlocutores, o governo quer romper com a brecha criada pela Justiça do Rio na venda da Varig (comprada pela Gol) de que companhia aérea é dona de slots. O entendimento é que esses espaços pertencem à União. Uma das metas é que, em caso de venda de companhias, parte dos slots não migre para a nova empresa, sendo redistribuídos.

— As normas foram feitas em uma época que se esperava uma fusão para criar uma gigante nacional, mas agora a realidade é outra, e devem ser estimulados novos participantes, em vez de fusões — explicou uma fonte que participa das discussão sobre o setor aéreo.

A regra da Anac para slots será alterada também para que as companhias que não forem eficientes, com muitos cancelamentos e atrasos, percam espaços nos aeroportos mais concorridos. Hoje é exigido delas um aproveitamento de 80%. A proposta é elevar este percentual para 90% em Congonhas, Guarulhos e Santos Dumont, onde os slots são mais concorridos.

— A lógica é ter um mecanismo para aumentar o número de entrantes — disse uma fonte.

Os gargalos nos aeroportos afetam o caixa das empresas, disse Eduardo Sanovicz, presidente da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear). Ele explicou que, sem espaço para os aviões pernoitarem nos aeroportos com maior demanda, as companhias são obrigadas a fazer voos desnecessários no deslocamento das aeronaves para terminais mais vazios.

— Acho preocupante ver a concorrência do mercado nas mãos de poucas empresas. O ideal seria ter novos concorrentes, mas o problema da infraestrutura é enorme, as empresas não têm para onde voar. O processo de concessão dos aeroportos está lento. Fala-se em conceder Galeão e Confins há pelo menos dois anos — disse o professor de Engenharia de Transporte Aéreo da Universidade de Calgary (Canadá), Alexandre Barros.

Diante dos prejuízos das empresas, motivado principalmente pela variação cambial e pelo aumento do preço do combustível, pelo menos uma parte do governo, como a Secretaria de Aviação Civil (SAC) e Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), defende a necessidade de reduzir os custos do setor, sobretudo do querosene de aviação, um pleito antigo das empresas.

A revisão na formação do preço do combustível já foi encaminhada ao Ministério da Fazenda, mas a solução levará algum tempo, pois está condicionada ao pleito da Petrobras para reajustar o preço a gasolina. Recentemente, a Fazenda autorizou a inclusão do setor na desoneração da folha de pagamento. E a Aeronáutica estuda pedido das companhais de dividir o reajuste das tarifas de navegação, que entra em vigor em janeiro.

Para André Castellini, da Bain & Company, as empresas terão que dar um passo atrás para voltar a crescer. O planejamento de expansão foi frustrado pelo desempenho da economia e pela alta dos custos.

— É preciso adequar a oferta à realidade do mercado. Num primeiro momento, as passagens vão subir e menos passageiros deverão voar. Mas a medida é necessária e deverá vir acompanhada de enxugamento de malha, além de corte de custos. Os prejuízos não se sustentam mais por muito tempo — disse Castelini.

SAC: investimentos de R$ 8 bi em aeroportos

A SAC informou, em nota enviada ao GLOBO, que o setor aéreo tem apresentado um crescimento impressionante desde 2003, numa taxa média de 11,2% ao ano. O número de passageiros transportados passou de 33 para 85 milhões ao ano. “Os preços de hoje são, em média, 43% mais baixos do que há 10 anos.”

“Todas essas mudanças obviamente exigem investimentos tanto nos aeroportos como das companhias aéreas”, reconhece a SAC, que prevê para até 2014 investimentos públicos e privados de mais de R$ 8 bilhões nos aeroportos brasileiros. “Isso promoverá o aumento na oferta de voos pelas companhias aéreas, maior concorrência entre as empresas e, consequentemente, continuidade da queda das tarifas.”

A SAC informa que acompanha de perto a competitividade do setor. A partir de janeiro de 2013, informa, entrará em vigor a desoneração da folha de pagamento das companhias aéreas, o que deve significar uma redução de custos da ordem de R$ 300 milhões ao ano.


Jornal Zero Hora - 27/09/2009
UMA CARREIRA PARA DECOLAR
Mercado nas alturas
Quantidade de profissionais capacitados não acompanha o crescimento do tráfego aéreo no país. O apagão de pilotos levou a Anac a custear aulas práticas em diferentes regiões.

Pilotos e outras profissões relacionadas à aviação podem garantir o seu embarque no mercado de trabalho. O tráfego aéreo de passageiros cresceu 6,5% apenas no primeiro semestre deste ano ante o mesmo período de 2008, de acordo com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), abrindo portas para muitas vagas.

Atualmente, são mais de 12 mil aeronaves – incluindo aviões e helicópteros civis de todas as categorias – responsáveis por transportar mais de 50 milhões de pessoas por ano no país. Mas na contramão do crescimento, faltam profissionais qualificados dispostos a seguir carreira, em terra e no ar, apontam especialistas do setor.

– Há carência principalmente de pilotos com experiência. Muitos, após a paralisação das atividades da Vasp, Transbrasil, Varig, Rio Sul, Nordeste e BRA, optaram por trabalhar no Exterior, onde salários e benefícios são mais atrativos – explica Graziella Baggio, presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas.

Juliano Noman, superintendente de Serviços Aéreos da Anac, discorda. Para ele, o problema não é a falta de mão de obra, mas a dificuldade de formar gente em um curto prazo.

– Temos profissionais suficientes. Mas precisamos treinar pessoas para suportar o crescimento que esperamos para os próximos anos – pondera o superintendente.

De acordo com Noman, é possível formar técnicos entre 12 meses e 18 meses. Porém, fazer com que a carreira decole no setor da aviação nem sempre é tarefa fácil de ser executada. Os cursos são caros para todos os cargos, argumenta Graziella:

– O investimento no aprendizado é alto. E os salários não atraem mais.

Investimento na formação é expressivo

Luiz Augusto Jaborandy, 23 anos, confirma que o retorno do alto investimento para começar a carreira muitas vezes só começa a aparecer a partir do terceiro ano de profissão, como estimam também os especialistas. Em 2007, acompanhando o pai, piloto militar em viagem aos Estados Unidos, conquistou as habilitações americanas de piloto privado, privado de helicóptero, voo por instrumento, comercial (de linhas áreas e táxi aéreo) e bimotor.

– É um diferencial para a carreira. O inglês é valorizado, principalmente a linguagem técnica. Sem contar a experiência adquirida em aviões cuja tecnologia é muitas vezes superior à nossa – avalia Jaborandy

De volta a Brasília há seis meses, o estudante do curso superior de aviação civil comemora a aprovação da experiência pela Anac. Isso porque, para validar a formação americana no Brasil, ele passou por provas teóricas e práticas elaboradas pelo órgão.